Lúcia Costa
Foi
Não me disse uma palavra:
chegou, jogou as malas no chão,
disse-se ser fome.
Comeu, fartou-se, dormiu, acordou, levantou, saiu...
Acordei, olhei, percebi, chorei e nunca mais amei!
_ Ei, a minha parede ainda é branca!
Lúcia Costa
Vendo um coração usado
e abusado.
Alguém quer fazer negócio?
Lúcia Costa
Na minha rua mora um louco
Que canta num dialeto solitário
uma canção doída demais
Para quem não sabe porque chora
Enquanto todos dormem
Ele berra ferozmente um nome de procedência feminina
E fala de um tempo vivido a três numa cabana de espuma
Lúcia Costa
Se um dia encontrar alguém com riso mais largo que o meu,
vai-te, tua alma necessita dessa felicidade estrangeira.
Se em uma noite encontrar calor mais fumegante que meu corpo
aquece-te, não morras de frio pela minha ausência.
Mas se um dia te arrependeres, volta!
Há em mim gargalhadas nascentes na lava do meu amor!
Lúcia Costa
Sobre a ausência do teu corpo
desenhei minha solidão.
Teus olhos levaram todas as primaveras da minha vida.
Sou alguém que se abandonou.
Saudade de ti, meu cais, meu porto, minha casa.
Volta pra mim, vem ser ao menos um raio de sol
iluminando essa caverna que me tornei
desde que tuas mãos covardes me acenaram aquele triste adeus!
Lúcia Costa
"Óh sol por que judia tanto de minhas cabras? por que seca o leite de minhas vacas?
por que mata de fome o sertão?
Em minha costa minha enchada e minha camisa surrada ainda me açoita sem compaixão.
Só um dia pega-se de mansinho,nem que seja,um tiquinho pra da alegria a meus meninos nesse mundinho."
Lúcia Costa
Sair por aí, amando os enganos,
Pedalando os sonhos embalados por mentiras,
redesenhando a vida,
Rabiscando a imagem inocente do amor primitivo,
matando-a e ressuscitando-a a cada pequenina luz verde lá no início da alma.
Ainda há tempo pra voar, e fugir daqui
E carregar o enfermo candelabro do ser,
o que é ao mesmo tempo, o escuro da meia-noite e o sol do meio-dia,
aquele que é oração e demônio
em uma valsa gelada de passos estreitos,
em um vácuo colorido e pertinente,
de um continente absurdamente próximo de nós,
Chamado AMAR.
Lúcia costa
Lúcia Costa
A vida é o maior dos enganos:
Quando nos vemos brincando de bonecas, desejamos bonecos vivos
Quando temos bonecos vivos, queremos logo grandes
Quando os vemos grandes, queremos voltar.
Queremos um beijo,
Depois o corpo,
Depois o ser por inteiro.
Depois queremos troca e troca.
Acreditamos em mutantes
E nos assustamos com a presença deles.
Quando se vê, a vida deixa de ser uma casa grande e sai pela janela.
Estamos sós e à porta de nós mesmos no escuro de um mundo desconhecido e nunca desejado.
Lúcia Costa
Lúcia Costa
Teu corpo é um planeta onde quero morar.
Teus olhos são os faróis que quero seguir.
Teu amor é o enigma que quero decifrar.
Lúcia Costa
Lúcia Costa
Hoje, quando acordei, olhei para o lado, e a digital do seu corpo ainda estava tatuada na cama, nos meus lençois, nos travesseiros felizes embriagados pelo perfume dos seus cabelos.
Agora, que já é noite e essa lua vem clareando teu rosto na minha imaginação, sinto ainda o leve toque do teu corpo nos meus lábios, entre os meus braços, caminhando em direção ao meu coração e se acomodando na minha alma, quietinho.
Que criatura terá criado o A-D-E-U-S?
Lúcia Costa
- Ei, quer brincar de amor?
- Não, prefiro brincar de algo menos perigoso. Que tal roleta russa?
Lúcia Costa
E naquele dia, enquanto todos brincavam na rua, aquela menina cantarolava uma música antiga, registro de tudo que seus 12 anos não lhe deixaram viver. Talvez ninguém tenha vivido aquela alegria da história de um carnaval em que columbinas e pierrôs trocavam beijos e juravam um a alma do outro.
As memórias são águas dormentes. São nascidas em um rio onde nunca nos banhamos. Há que se inventar o arcoíris, o novo, a perfeição. A menina ainda não vivera o fogo, nem a água contida nas lágrimas do amor. Encontrava-se em frente a uma porta que jamais conseguirá abrir, mas sente-se extasiada, ao menos consegue bater a porta. E se abrem?
Lúcia Costa
Soube daquele dia porque nosso corpo registrou um outro raio de sol. Estávamos ocupados demais com o entrelaçamento das pernas, e mãos, e coxas. Havia oxigênio suficiente para mim dos restos da tua respiração.
Chegada a noite, nada mais a dizer, nada mais a fazer: seus olhos estavam cansados dos meus, seu corpo nem suportava mais o calor deste que agora te fala já sem vida.
Salve os dias, somente os dias. Nunca mais quero noite, o escuro da noite, o breu que te faz voltar pra casa, voltar pra ela, e, dessa maneira, matar todas as luas da minha vida!
Lúcia Costa
Tanta criança que chora
tanta mãe que se demora
tanta lágrima pelo chão.
Tanto coração amando
tanto amor se desprezando
tanto sonho foi em vão
Tem o Tempo dois destinos:
um que se chama menino
e o outro Solidão.
Lúcia Costa
Resolvi estacionar
Parar em algum lugar para pedir água fresca e descansar um pouco.
Quero aposentos distantes,
Quero me esconder do sol,
Quero quebrar em pedaços bem pequenos essa minha bússola pátria.
Quero luz pouca para lamentar meu ser sem enxergar minhas próprias lágrimas.
Estou há tanto na vida,
Passando por corredores largos,
Tropeçando nessa correria de me encontrar.
Fiquei só. Amei só. Provei da mais aguada das bocas,
E vou morrer no insulso mundo daqueles que abandonam seus barcos
Essa é a despedida de um marinheiro que nunca aprendeu a remar.
As águas estão ficando turvas e bravas e se remoem e se voltam contra mim,
Também não sei nadar. Estive ocupada demais com as estradas e esqueci que só sobrevivem aqueles que se lançam ao mar.
Lúcia Costa
Pessoa que marchou de volta
Abandonando a trilha das estrelas.
Ser embriagado pelo lado sem freio da vida
Em direção a um túnel com pouca luz.
Sou um prisioneiro sem cela
Crime cometido na ausência dos teus olhos
Na mentira vasta do teu sorriso
Na cama macia da tua alma.
Sou, por ti, um cego condenado à luz.
Mostra-me a saída,
Segura minhas mãos,
Leva-me de volta.
Quero ser pra sempre prisioneiro
Da tua brincadeira de amar!
Lúcia Costa
Dos cabelos da menina
Fugiam as borboletas.
Da boca da menina
Voava um poema infante.
Do corpo da menina
Exalava cheiro de talco.
A menina adormeceu
Acordou a bela musa
Nos cabelos, uma prisão
Na boca, palavras fortes
E no corpo, ah, naquele corpo,
Moram todos os meninos que capturaram as borboletas!